Embora não se saiba positivamente a invocação e nem o local
do primeiro templo levantado em Santa Maria pelos primeiros colonizadores, o
estudo da difusão do povoamento nas primeiras décadas e a comparação com as
primeiras narrativas sobre esse povoamento, permitem aceitar que a Ermida dos
Anjos tenha sido esse templo . Será, assim, a mais antiga da ilha e do
arquipélago açoriano.
Erguida ainda em 1439, primitivamente em madeira com
cobertura de palha, foi reerguida em alvenaria de pedra entre 1460 e 1474.
É referida no testamento do Infante D. Henrique: "Item
ordenei e estabeleci (...) a igreja de santa Maria na ilha de santa
Maria."
Nela terão cumprido o voto de ouvir missa em Acção de
Graças, em 19 de Fevereiro de 1493 os marinheiros de Cristóvão Colombo no
regresso da viagem de descobrimento da América.
Encontra-se indicada no "Mapa dos Açores" (Luís
Teixeira, c. 1584) como "Perochia de S. Siria", e, em mapas
posteriores nele baseados, a toponímia "Parochia de Santa Eria". Uma
possível explicação ligará a devoção a Santa Iria, natural de Tomar, à Ordem de
Cristo, que nessa cidade tinha a sua sede, chefiada pelo Infante D. Henrique
com o título de "Regedor e Governador da Ordem de Cavalaria do Mestrado de
Nosso Senhor Jesus Cristo". À Ordem pertencia também Gonçalo Velho Cabral,
primeiro capitão do donatário.
A principal fonte sobre a ermida é um documento de autoria
do padre Francisco da Cunha Prestes, licenciado no Curso Geral de Teologia na
Universidade de Évora de 1650 a 1653,4vigário da Igreja Matriz de Nossa Senhora
da Assunção de Vila do Porto, o manuscrito "Livro da Irmandade de Nossa
Senhora dos Anjos e Escravos da Cadeinha" (1676) que pertencia ao arquivo
da Matriz de Vila do Porto:
"Esta ermida de Nossa Senhora dos Anjos fundou hua m.er
natural do Reyno por nome Izabel Glz. [Isabel Gonçalves] m.er de Thome Afonso
natural do Algarve. Pediu este citio a D. Beatriz [Godin, primeira] m.er do
[2º] Cap. Donatario [(João Soares de Albergaria)] a qual lhe deu tres alqueires
de terra em q. se fundou a dita ermida por outros tres q. a dita Izabel Glz.
lhe deu em sima da rocha os quais três alqueires em q. está a ermida deixou
para o ermitão que a limpasse. O anno em q. foi feita esta fundação não se acha
noticia certa por averem passado m.tos e porq. com a entrada dos mouros q. no
anno de 1616 saquearão esta ilha levando muita gente cativa fiarão sepultadas
as noticias q. disto podia aver. Sabe-se q. escapou esta ermida dos mouros e he
tradição certa q. a não virão andando perto dela como também se presume q. a
não virã o anno de 1675, pois entrando de assalto neste citio por descuido dos
guardas a noute do pr.º de Setembro levando destas casinhas vesinhas da ermida
onze pessoas entre molheres e meninos e juntamente saqueando as não tocarão na
ermida q. se por tal a conhesserão ao menos não escapava de ser saqueada e se
presumirão ser caza de moradores pr.º avião fazer entrada nela que nos
palheiros de onde tirarão a gente e sua pobreza. Esteve esta ermida sem forma
de adro até o anno de 1674 dentro nela não avia mais q. hum retabolo antígo q.
se fechava com duas portas, estando e costado na parede e chegava a pregar na
tacanissa o qual agora está ensserido no meio do retabolo."
A referida Dona Beatriz (Brites) Godin faleceu por volta de
1492-1493, época em que se encontrava com o marido no Continente, e em que
Cristóvão Colombo enviou os seus marinheiros a terra para assistir missa em Fevereiro
de 1493.
O pesquisador Miguel Corte-Real levanta a dúvida se Tomé
Afonso e sua esposa Isabel Gonçalves seriam ou não os primitivos fundadores, se
apenas reedificadores, ou mesmo apenas padroeiros mais modernos da ermida.7
Conforme a sua pesquisa, de acordo com um documento na Biblioteca Pública e
Arquivo de Ponta Delgada, no espólio Velho Arruda, é referido um Tomé Afonso,
casado com Isabel Gonçalves, que, por volta de 1560 deixaram ambos parte de
seus bens para a conservação da ermida.
Quando do assalto de piratas da Barbária em 1616, que se
demoraram oito dias na ilha e dela levaram 222 pessoas, as suas reduzidas
dimensões e despojamento terão feito com que passasse despercebida, fato que
Frei Agostinho de Monte Alverne, em fins do século XVII, credita a um milagre
da Virgem:
"(...) e somente não chegaram à Igreja de Nossa Senhora
dos Anjos, andando por cima de sua ladeira, sendo vistos das pessoas que dentro
estavam, o que se crê que quis a bendita Senhora não vissem a sua igreja. (...)."
Foi reconstruída, com nova traça, de 1673-1674 a 1676. Em
maio de 1675 procedeu-se à abertura do "caminho que vai pela rocha acima e
o fizeram por sua devoção os devotos da Senhora pela dificuldade que havia para
poderem descer à ermida" e que "em Setembro do mesmo ano se faz o
calvário ou cruzeiro que está no cimo da rocha", junto ao Caminho Velho .
A iniciativa da reconstrução deve-se a Frei Gonçalo de São José, que veio para
o Convento de Nossa Senhora da Vitória em 1668-1669, sendo o principal obreiro
da Irmandade dos Escravos da Cadeinha, confirmada em 1675 pelo Bispo de Angra,
D. Frei Lourenço de Castro. Esta criação, em carácter devotivo, terá tido lugar
após o ataque dos piratas de 1675.
Em 1826 era seu padroeiro o morgado Luís de Figueiredo Velho
Melo Falcão. Ao final do século XIX sofreu obras que a restauraram (1893),
conferindo-lhe a actual feição.
Júlio Cabral testemunha ter visto nesta ermida um missal
"(...) velho mas bem conservado, que também se diz ser o mais antigo dos
Açores (...)", mas cujo paradeiro, à época (1903), desconhecia. Do mesmo
modo, com relação ao chicote com que os piratas terão fustigado os habitantes,
o mesmo autor refere: "que existiu junto da Sacra, onde o vi, mas há anos
desapareceu, supondo-se que foi destruído pelos devotos!"
Encontra-se classificada como Imóvel de Interesse Público
pela Resolução nº 58, de 17 de maio de 2001.
A festa da padroeira ocorre, anualmente, a 21 de Agosto.